domingo, 13 de março de 2011

Depoimento: EU TENTEI ME SUICIDAR...

Sinceramente eu tentei inúmeras vezes apagar essa cena da minha memória, mas creio que é melhor manter aquela tarde chuvosa ainda viva em minha mente. Como pude ao menos pensar nisso?
Na maioria das vezes eu finjo que aquele momento não ocorreu, que nunca desejei morrer, que sempre fui forte... mas essa lembrança sempre volta. Hora me assusta, hora me encoraja.
Minha vida estava caindo. Desempregada, vivendo de caridade alheia, grávida de uma pessoa totalmente problemática, acomodada e possessiva.
Não tinha ânimo nem para sair da cama. Minha casa era suja, escura, tinha um odor ruim. Os pratos ficavam na pia até formar mofo, e eu não tinha forças para sair do quarto, da escuridão. Somente chorava e me lamentava. A fraqueza que eu sentia era mental e fisica. Não era somente o meu corpo que estava caido; minha alma também estava. A dor era bem maior que eu, era maior que o mundo.
Olhava as demais pessoas e pensava: "como eu gostaria de ser ela" (qualquer pessoa, não fazia a menos distinção). Imaginava: "a vida dela é tão normal... Eu queria tanto uma vida simples e normal..."
Sentia-me só e humilhada. Vivia de favores dos outros. Sentia-me envergonhada por ter ficado grávida em uma situação tão complicada, e tendo como companheiro uma pessoa que estava tão ou mais deprimido que eu.
Tinha vontade de ir à luta, mas como? Grávida ninguém me daria um emprego. Mal podia sair da cama. Senti enjôos até o sexto mês de gestação. Passava o tempo todo deitada, sem comer, no escuro e no silêncio. Somente assim a náusea era um pouco menos intensa.
Meu então companheiro não queria trabalhar. Passávamos o dia inteiro trancados na escuridão, chorando, nos lamentando, pensando em como as coisas já foram melhores, e como nossa vida tornou-se uma total miséria. Eu tinha nele meu consolador e meu algoz. Se por um lado ele era a única pessoa que me ouvia e não me criticava, por outro, ele permitia que eu passasse por toda aquela miséria sem mover uma palha.
Quando éramos namorados, meu então companheiro tentou se matar duas vezes em minha frente quando tentei romper o relacionamento. Com medo de que ele fizesse uma tolice, cedi e permaneci com o namoro, e após, fomos morar juntos.
E lá estava eu... Grávida novamente e com uma filha pequena. Vivendo de esmolas, trancada em uma depressão, em uma tristeza e em uma escuridão tão grande, a qual eu nunca imaginei que eu um dia pudesse provar.
É engraçado que naquela época a gestação parecia eterna. Hoje eu vejo: era uma questão de tempo até o bebê nascer, eu arrumar um emprego, e resolver eu mesma a situação. Mas naquela época eu não conseguia ver uma luz no fim do túnel; para mim, aquela situação seria eterna.
Comecei a pensar que o melhor seria morrer. Quando era muito jovem, eu já havia pensado em suicidio quando perdi meu pai, mas agora a idéia havia voltado com força muito maior. A vontade de morrer tornou-se uma constante em minha mente. Aquilo tudo não tinha mais solução.
Pensei na minha filha tão amada, indefesa e pequena. Imaginei: Bem, a avó cuidará dela. Mas o pequeno ser que carrego em meu ventre?
Pensei, e respondi a mim mesma: farei o favor de não permitir que ela venha a este mundo miserável.
Fui até à cozinha, peguei a maior e mais afiada faca que achei, e tranquei-me no banheiro... Apenas eu, a faca e minha enorme barriga.
Mas e o medo de sentir dor? Bem, terei de suportá-lo...
Comecei a passar a faca bem lenta e fortemente pelo meu pulso. As forças eram ambíguas; se por um lado eu tinha medo de me ferir, por outro, queria acabar logo com aquele desespero...
E eu continuei... Tentei manter a mente o mais vazia possível para evitar que algum pensamento me fizesse mudar de idéia.
A sensação era de que eu estivesse em transe. Esforcei-me para manter a mente vazia. Aquela mesma mente tão cansada, mente tão sofrida... Cansada de tanta dor, de tanta humilhação, de tanto ódio de mim mesma, vergonha da minha  condição...
Então baixei o olhar. Vi aquela barriga enorme. Eu me sentia a grávida mais horrível do mundo. Estava com mais de cem quilos, e não gostava da minha barriga de gestante.
Porém, ainda assim, olhando para aquela "coisa feia!", lembrei-me que ali dentro havia alguém que não pediu para nascer. Não pediu para estar ali. Lembrei-me de um aborto da adolescência... Do meu ódio de mim mesma por ter sido tão fraca e covarde... Por não ter permitido que aquele bebê viesse à luz...
Pensei: Vou matar outra vez o fruto do meu ventre?
Aquela pergunta ecoou tão fortemente dentro de mim, que senti de imediato uma náusea e um desespero enorme.
Observei detalhadamente aquela barriga enorme. Eu não estava necessáriamente linda, mas aquela jóia preciosa que habitava meu interior era tão especial, tão indefeso, mas ao mesmo tempo tão forte, que decidi continuar lutando. Continuaria por mim e por aquele pequeno ser que estava sendo formado dentro de mim
Olhei para o pulso. Ainda não estava totalmente lacerado, mas já apresentava um corte. 
Cai em mim. Corri para a cozinha, joguei a faca na pia, lavei o pulso e o rosto, e disse a mim mesma: vou lutar mais um pouco. Não tenho forças, aparentemente está tudo destruído, mas eu vou tentar. Não sei se vou conseguir alguma coisa, mas continuarei lutando. Se não por mim, mas pelos meus filhos.
Naquela tarde eu decidi dizer SIM à vida, sim ao último fio de uma esperança sem fundamento lógico para mim, mas aquilo era tudo o que eu tinha.
Novas provas ainda me aguardavam, e posso garantir que foi tudo muito duro, mas eu dei a volta por cima.
Hoje ainda passo por momentos ruins, tenho frustrações, problemas, tristezas... tudo aquilo que qualquer ser humano tem, mas uma coisa eu lhe garanto: por pior que seja a vida, ainda vale a pena continuar lutando.
Quem tenta se suicidar não quer acabar com a vida, quer acabar com o sofrimento. Eu decidi levantar a bandeira da vida. Foi necessário bater de frente com a tristeza e com adversidade (com a qual bato de frente todos os dias), mas sei que viver AINDA é a melhor saída.
É preciso manter acesa a chama, por pior que seja a situação. Como diria a canção de Raul Seixas:

"Tente! Não diga que a canção está perdida,
 Tenha fé em Deus, tenha fé na vida.
Tente outra vez!"

Dedico este post à minha filha (Gisele), que hoje é um anjo lá no céu. Continue pedindo a Deus por mim, minha querida. Perdoe-me por tudo.

(Depoimento cedido por O., mãe de duas crianças, em São Paulo)



 

sábado, 12 de março de 2011

PREVENÇÃO DO SUICIDIO



Agora que entendemos um pouco sobre quais são os principais grupos de risco, iremos abordar o que fazer quando uma pessoa dá indícios ou deixa claro que pretende suicidar-se. Caso não tenha visto esse post, clique aqui.

Os dois pontos principais a serem observados são:
1) identificar a presença de ideações suicidas;
2) saber como ajudar.

Como vimos anteriormente, o suicídio está intimamente ligado à depressão, bipolaridade, esquizofrenia, transtornos de personalidade, além do abuso de substâncias como drogas ilícitas, álcool e medicamentos. Então falemos um pouco sobre cada um deles...


DEPRESSÃO:
A depressão é sem dúvida um dos maiores fatores de risco para o comportamento suicida (incluo no termo depressão sobretudo os transtornos de humor). 
O diagnóstico deve sempre ser feito por um profissional, contudo, algumas atitudes podem ser indicativas deste mal.
O que mais devemos saber sobre a depressão? Veja a seguir:

• Acomete, ao longo da vida, entre 10 e 25% das mulheres e entre 5 e 12% dos homens.
• Quanto mais precoce o tratamento, mais rápida a remissão, e menor a chance de cronificação.
• Entre os gravemente deprimidos 15% se suicidam.
• Cerca de 2/3 das pessoas tratadas respondem satisfatoriamente ao primeiro antidepressivo prescrito.

SINTOMAS DE DEPRESSÃO:


Os sintomas a seguir têm que estar presentes há mais de 2 semanas, trazerem sofrimento significativo, alterarem a vida social, afetiva ou laboral do indivíduo e não serem devido a um luto recente.

• Sentir-se triste, durante a maior parte do dia, quase todos os dias;

• Perder o prazer ou interesse em atividades rotineiras (anedonia);
• Irritabilidade (pode substituir o humor deprimido em crianças e adolescentes);
• Desesperança;
• Queda da libido;
• Perder peso ou ganhar peso (não estando em dieta);
• Dormir demais ou de menos, ou acordar muito cedo;
• Sentir-se cansado e fraco o tempo todo, sem energia;
• Sentir-se inútil, culpado, um peso para os outros;
• Sentir-se ansioso;
• Sentir dificuldade em concentrar-se, tomar decisões e dificuldade de memória;
• Ter pensamentos freqüentes de morte e suicídio.

ALGUMAS DICAS PARA IDENTIFICAR UMA POSSÍVEL DEPRESSÃO:


Pergunte...

• Sobre coisas do dia-a-dia que o indivíduo gostava de fazer, como, por exemplo ver uma novela, brincar com o cachorro, ler o jornal, escutar música... A seguir, pergunte se ele continua fazendo e tendo prazer ao fazer tais atividades.
• Se ele se anima com coisas positivas que estão para acontecer, se tem esperança.
• Se a tristeza que ele está sentindo é diferente da tristeza que ele já sentiu quando viveu outras situações difíceis.
• Sobre desejo de estar morto, ou de se matar.
• Quando, além de depressão, a pessoa mostra-se desesperada, o risco de suicídio é maior.

ATITUDES QUE CONDUZEM AO ERRO PARA IDENTIFICAR A DEPRESSÃO:


“No lugar dele eu também estaria deprimido.”

"Depressão só dá em quem tem fraqueza de caráter.”
“Você só está estressado...”
"Depressão é uma conseqüência natural do envelhecimento.”
"Só depende de você: força de vontade cura a depressão!"
"Antidepressivos são perigosos e viciam; melhor não tomá-los”



PARA SABER MAIS:

Depressão e Distimia
Bipolaridade
Esquizofrenia
Dependência Química


IDENTIFICANDO A DEPENDÊNCIA DO ÁLCOOL:

A síndrome de dependência é um conjunto de fenômenos fisiológicos, comportamentais e cognitivos no qual o uso de uma substância alcança prioridade na vida do indivíduo. Pelo menos três dos seguintes critérios devem estar presentes no último ano:

• forte desejo ou compulsão pelo consumo;
• dificuldade de controlar o consumo a partir de seu início;
• sinais e sintomas de abstinência quando o uso cessa ou é reduzido, ou uso da substância para evitar ou aliviar sintomas de abstinência;
• evidência de tolerância ao consumo do àlcool (ou seja, a pessoa parece não sentir tão fortemente os efeitos do abuso do àlcool);
• abandono de atividades e interesses em favor do uso da substância;
• persistência do uso a despeito de conseqüências nocivas.

Especificamente com o álcool, à medida que a dependência se instala, há uma tendência a beber independentemente da situação ou horário, bem como preferência por bebidas de maior teor alcoólico. Também ocorre uma rápida reinstalação da síndrome após período de abstinência (isto é, a pessoa começa a sentir rapidamente os efeitos da abstinência do consumo da bebida).


TRANSTORNOS DE PERSONALIDADE:


O elemento central dos transtornos de personalidade, segundo Kurt Schneider, é que o indivíduo apresenta as seguintes características básicas:


• sofre e faz sofrer a sociedade;
• não aprende com a experiência.

Embora, de um modo geral, produzam conseqüências muito penosas para a própria pessoa, familiares e pessoas próximas, não é facilmente modificável por meio de experiências da vida; tende a se manter estável ao longo de toda a vida.

SUICÍDIO: ASPECTOS PSICOLÓGICOS

Existem estágios no desenvolvimento da intenção suicida, iniciando geralmente com a imaginação ou contemplação da idéia suicida. Posteriormente, um plano de como se matar, que pode ser implementado por meio de ensaios realísticos ou imaginários, até, finalmente, culminar em uma ação destrutiva concreta. Contudo, não podemos esquecer que o resultado de um ato suicida depende de uma multiplicidade de variáveis, nem sempre envolvendo planejamento.

Existem três características próprias do estado em que se encontra a maioria das pessoas sob risco de suicídio:

 
1. Ambivalência: é atitude interna característica das pessoas que pensam em, ou que tentam o suicídio. Quase sempre querem ao mesmo tempo alcançar a morte, mas também viver. O predomínio do desejo de vida sobre o desejo de morte é o fator que possibilita a prevenção do suicídio. Muitas pessoas em risco de suicídio estão com problemas em suas vidas e ficam nesta luta interna entre os desejos de viver e de acabar com a dor psíquica. Se for dado apoio emocional e o desejo de viver aumentar, o risco de suicídio diminuirá.
 

2. Impulsividade: o suicídio pode ser também um ato impulsivo. Como qualquer outro impulso, o impulso de cometer suicídio pode ser transitório e durar alguns minutos ou horas. Normalmente, é desencadeado por eventos negativos do dia-a-dia. Acalmando tal crise e ganhando tempo, o profissional da saúde pode ajudar a diminuir o risco suicida.   


3. Rigidez/constrição: o estado cognitivo de quem apresenta comportamento suicida é, geralmente, de constrição (aperto, retração, estreitamento). A consciência da pessoa passa a funcionar de forma dicotômica: tudo ou nada. Os pensamentos, sentimentos e ações estão constritos, quer dizer, constantemente pensam sobre suicídio como única solução e não são capazes de perceber outras maneiras de sair do problema. Ficam fixadas apenas no termino de suas vidas, e não na resolução e compreensão da causa raiz de seu problema. Pensam de forma rígida e drástica: “o único caminho é a morte”, “não há mais nada o que fazer”, “a única coisa que poderia fazer era me matar”. Análoga a esta condição é a “visão em túnel”, que representa o estreitamento das opções disponíveis de muitos indivíduos em vias de se matar.

A maioria das pessoas com idéias de morte comunica seus pensamentos e intenções suicidas. Elas, freqüentemente, dão sinais e fazem comentários sobre “querer morrer”, “sentimento de não valer pra nada”, e assim por diante. Todos esses pedidos de ajuda não podem ser ignorados.


Fique atento às frases de alerta. Por trás delas estão os sentimentos de pessoas que podem estar pensando em suicídio. São quatro os sentimentos principais de quem pensa em se matar. Todos começam com “D”: depressão, desesperança, desamparo e desespero (regra dos 4D). Nestes casos, frases de alerta + 4D, é preciso investigar cuidadosamente o risco de suicídio.


FRASES DE ALERTA:


Eu preferia estar morto”.

Eu não posso fazer nada”.
Eu não agüento mais”.
Eu sou um perdedor e um peso pros outros”.
Os outros vão ser mais felizes sem mim”.

SENTIMENTOS (4 D´s):

 
1.      depressão;
2.      desesperança;
3.      desamparo;
4.      desespero.

IDÉIAS SOBRE SUICÍDIO QUE LEVAM AO ERRO:
Se eu perguntar sobre suicídio, poderei induzir a pessoa a fazer isso”. – Questionar sobre idéias de suicídio, fazendo-o de modo sensato e franco, aumenta o vínculo com o paciente. Este se sente acolhido por um profissional cuidadoso, que se interessa pela extensão de seu sofrimento.

Ele está ameaçando suicídio apenas para manipular”. – A ameaça de suicídio sempre deve ser levada a sério. Chegar a este tipo de recurso indica que a pessoa está sofrendo e que necessita de ajuda.


Quem quer se matar, se mata mesmo”. – Essa idéia pode conduzir à imobilidade das atitudes, ou ao descuido no manejo no tratamento de pessoas sob risco. Isso não vai bloquear 100% do risco de suicidio, mas vai diminuir as chances; impedir suicidios que podem ser evitados.

 

Quem quer se matar não avisa”. – Pelo menos dois terços das pessoas que tentam ou que se matam, haviam comunicado de alguma maneira sua intenção para amigos, familiares ou conhecidos.

O suicídio é um ato de covardia (ou de coragem)”. – O que dirige a ação auto-inflingida é uma dor psíquica insuportável e não uma atitude de covardia ou coragem.


No lugar dele, eu também me mataria”. – Há sempre o risco de nos  identificarmos profundamente com aspectos de desamparo, depressão e desesperança da pessoa, sentindo-se impotente ao tentar ajudá-lo. Há também o perigo de se valer de um julgamento pessoal subjetivo para decidir as ações que fará ou deixará de fazer.


Veja se da próxima vez você se mata mesmo”. – O comportamento suicida exerce um impacto emocional sobre a equipe de saúde no atendimento emergencial, podendo provocar sentimentos de franca hostilidade e de rejeição. Isso é capaz de impedi-la de encarar a tentativa de suicídio como um possível marco em uma trajetória pessoal acidentada, a partir do qual se podem mobilizar forças para uma mudança de vida.
Não permita e não faça este tipo de comentários. Isso apenas complica ainda mais a situação.

Quem se mata é bem diferente de quem apenas tenta”. – Diversos estudos epidemiológicos demonstraram que, vistas em conjunto, as pessoas que tentam o suicídio apresentam características diferentes daquelas que chegam a um desenlace fatal. No entanto, esses achados não deveriam funcionar como álibi para a pouca atenção dispensada aos que tentam o suicídio, mas não morrem.
A pessoa que apenas tentou o suicidio, corre riscos também. inclusive, é comprovado que uma tentativa prévia é fator de risco para uma nova tentativa.

Após uma tentativa de suicídio, uma melhora rápida das condições mentais significa que o perigo passou”. – Uma melhora rápida exige atenção redobrada, pois não significa que a crise acabou. Vale lembrar que muitos suicídios se efetivam pouco tempo após uma tentativa prévia.




COMO AJUDAR A PESSOA COM RISCO DE SUICÍDIO?

Quando as pessoas dizem “Eu estou cansado da vida” ou “Não há mais razão para eu viver”, elas geralmente são rejeitadas, ou, então, são obrigadas a ouvir sobre outras pessoas que estiveram em dificuldades piores. Nenhuma dessas atitudes ajuda a pessoa sob risco de suicídio.


O contanto inicial é muito importante. Ele deve ocorrer em um local reservado, evitando ao máximo expor a pessoa.

 
1. O primeiro passo é achar um lugar adequado, onde uma conversa tranqüila possa ser mantida com privacidade razoável.
2. O próximo passo é reservar o tempo necessário. Pessoas com ideação suicida usualmente necessitam de mais tempo para deixarem de se achar um fardo. É preciso, também, estar disponível emocionalmente para lhes dar atenção.
3. A tarefa mais importante é ouvi-las efetivamente. Conseguir esse contato e ouvir é por si só o maior passo para reduzir o nível de desespero suicida.
O objetivo é preencher uma lacuna criada pela desconfiança, desespero e perda de esperança e dar à pessoa a esperança de que as coisas podem mudar para melhor.
Uma abordagem calma, aberta, de aceitação e de não-julgamento é fundamental para facilitar a comunicação.
·        Ouça com cordialidade;
·        Trate com respeito (não critique!);
·        Coloque-se no lugar da pessoa (empatia);
·        Seja discreto e sigiloso.



COMO SE COMUNICAR:

• Ouvir atentamente, com calma.
• Entender os sentimentos da pessoa (empatia).
• Dar mensagens não-verbais de aceitação e respeito.
• Expressar respeito pelas opiniões e valores da pessoa.
• Conversar honestamente e com autenticidade.
• Mostrar sua preocupação, cuidado e afeição.
• Focalizar nos sentimentos da pessoa.



COMO NÃO SE COMUNICAR:
 
• Interromper muito freqüentemente.
• Ficar chocado ou muito emocionado.
• Dizer que você está ocupado.
• Fazer o problema parecer trivial.
• Tratar o paciente de maneira que o coloca numa posição de inferioridade.
• Dizer, simplesmente, que tudo vai ficar bem.
• Fazer perguntas indiscretas.
• Emitir julgamentos (certo x errado), tentar doutrinar.



COMO ABORDAR:

Como você se sente ultimamente?” “Existem muitos problemas na sua vida?” “O que tem tentado fazer para resolvê-los?” Em geral estas perguntas abrem espaço para as pessoas falarem de si mesmas e de como estão lidando com as dificuldades.
A partir daí, se a pessoa demonstra estar cansada de viver, parece estar querendo fugir, acha a morte atraente, ou quando a equipe de saúde suspeita que exista a possibilidade de um comportamento suicida, os seguintes aspectos necessitam ser avaliados:

• Observe o estado mental atual - Parece estar sob efeito de alguma substância? Apresenta discurso coerente, porém com pensamentos sobre morte e suicídio?;

• Plano suicida atual – quão preparada a pessoa está, grau de planejamento e quão cedo o ato está para ser realizado;
• Sistema de apoio social da pessoa (os vínculos familiares são fortes? A pessoa tem amigos que possa ajuda-lo? Os vinculos entre você e a pessoa estão fortes ultimamente, ou vocês estão meio distantes? etc.).
A melhor maneira de descobrir se uma pessoa tem pensamentos de suicídio é perguntar para ela. Ao contrário da crença popular, falar a respeito de suicídio não inocula a idéia na cabeça das pessoas. Elas até ficarão muito agradecidas e aliviadas de poder falar abertamente sobre os assuntos e questões com as quais estão se debatendo. Necessariamente, você também não terá que “carregar” o problema da pessoa, caso não se sinta momentaneamente capaz: poderá pedir ajuda para outros profissionais da equipe de saúde.

Como perguntar?


A maioria das pessoas acredita que não é fácil perguntar para o outro sobre ideação suicida e não se sente preparada para lidar com isso. Será mais fácil se você chegar ao tópico gradualmente. Desde o início tente estabelecer um vínculo que garanta a confiança e a colaboração da pessoa, pois este pode ser um momento em que ele se encontra enfraquecido, hostil e nem sempre está disposto a colaborar. Respeite a condição emocional e a situação de vida que o levou a pensar sobre suicídio, sem julgamento moral, em uma atitude de acolhimento.

Algumas questões úteis são:

• Você se sente triste?
• Você sente que ninguém se preocupa com você?
• Você sente que a vida não vale mais a pena ser vivida?
• Já pensou que seria melhor estar morto ou tem vontade de morrer?

Quando perguntar?

Desde o primeiro contato você já vai criando um momento para isso. Não existe um momento específico, cada um tem sua forma de conversar e cada caso é diferente do outro, mas aí vão umas dicas de momentos oportunos.

• Quando você percebe que a pessoa tem o sentimento de estar sendo compreendida;

• Quando a pessoa está confortável falando sobre seus sentimentos;
• Quando a pessoa está falando sobre sentimentos negativos de solidão, desamparo, etc.

O que perguntar?

Estas perguntas o ajudarão a quantificar o risco, por isso são importantes.

1. Descobrir se a pessoa tem um plano definido para cometer suicídio:

• Você fez algum plano para acabar com sua vida?
• Você tem uma idéia de como vai fazê-lo?
2. Descobrir se a pessoa tem os meios para se matar:
• Você tem pílulas, uma arma, veneno, ou outros meios?
• Os meios são facilmente disponíveis para você?
3. Descobrir se a pessoa fixou uma data:
• Você decidiu quando você planeja acabar com sua vida?
• Quando você está planejando fazê-lo?

(TODAS ESTAS PERGUNTAS DEVEM SER FEITAS COM CUIDADO, PREOCUPAÇÃO E COMPAIXÃO)

RESUMINDO:
P) Se eu perguntar sobre o suicídio, posso induzir o suicídio?
R) Não! Continue dando apoio!


P) Vou ter que carregar o problema da pessoa?
R) Não. Ajude-a, mas também procure apoio de outras pessoas, como amigos e parentes, e acima de tudo, apoio profissional (psiquiatras, terapeutas, etc)

PESSOAS SOB RISCO DE SUICÍDIO:

Como já falamos anteriormente, as pessoas que pensam sobre suicídio em geral falam sobre isso. Entretanto, existem alguns sinais que podemos procurar na história de vida e no comportamento das pessoas. Estes sinais indicam que determinada pessoa tem risco para o comportamento suicida. Portanto, deve-se ficar mais atento com aqueles que apresentam:


1. Comportamento retraído, inabilidade para se relacionar com a família e amigos, pouca rede social.

2. Doença psiquiátrica.
3. Alcoolismo.
4. Ansiedade ou pânico.
5. Mudança na personalidade, irritabilidade, pessimismo, depressão ou apatia.
6. Mudança no hábito alimentar e de sono.
7. Tentativa de suicídio anterior.
8. Odiar-se, sentimento de culpa, de se sentir sem valor ou com vergonha.
9. Uma perda recente importante – morte, divórcio, separação, etc.
10. História familiar de suicídio.
11. Desejo súbito de concluir os afazeres pessoais, organizar documentos, escrever um testamento, etc.
12. Sentimentos de solidão, impotência, desesperança.
13. Cartas de despedida.
14. Doença física crônica, limitante ou dolorosa.
15. Menção repetida de morte ou suicídio.



COMO LIDAR COM A PESSOA?

Em primeiro lugar, ao identificar o risco de suicídio, a pessoa deve ser encaminhada para atendimento com um profissional.

Existem diferentes níveis de risco para suicídio, bem como abordagens especificas.





BAIXO RISCO

A pessoa teve alguns pensamentos suicidas, como “Eu não consigo continuar”, “Eu gostaria de estar morto”, mas não fez nenhum plano.

Ação Necessária

 
• Oferecer apoio emocional. É importante ter uma equipe treinada para orientar o indivíduo a falar sobre as circunstâncias pessoais e sociais emergentes que o colocam sob risco.
• Trabalhar sobre os sentimentos suicidas. Quanto mais abertamente a pessoa fala sobre perda, isolamento e desvalorização, menos confusas suas emoções se tornam. Desabafar é uma espécie de terapia! Quando esta confusão emocional cede, a pessoa pode se tornar reflexiva; as respostas para seus problemas podem fluir mais facilmente quando ela se abre com alguém. . Este processo de reflexão é crucial, ninguém senão o próprio indivíduo pode revogar a decisão de morrer e tomar a decisão de viver.
• Focalize nos aspectos positivos da pessoa, fazendo-a falar sobre como problemas anteriores foram resolvidos sem recorrer ao suicídio. É uma forma de motivá-la, e ao mesmo tempo recuperar a confiança em si mesma.
• Pelo menos até que ela receba tratamento adequado, encontre-a em intervalos regulares e mantenha contato mais próximo.
• Nem todas as pessoas com pensamentos suicidas procurarão ajuda nos  serviços especializados, portanto, estas pessoas com baixo risco deverão ser observaas de perto.

MÉDIO RISCO


A pessoa tem pensamentos e planos, mas não tem planos de cometer suicídio imediatamente.

Ação Necessária:

• Ofereça apoio emocional, trabalhe com os sentimentos suicidas da pessoa e focalize nos aspectos positivos (já descritos acima).

• Focalize os sentimentos de ambivalência. Entenda a divisão entre os desejos de querer morrer e viver, e procure fazer com que o desejo de viver se fortaleça.
• Explore alternativas ao suicídio. Mostre-o que existem alternativas para o seu problema, na esperança de que a pessoa vá considerar ao menos uma delas.
• Faça um contrato, negocie, aqui é o momento para usar a força do vínculo existente entre você e a pessoa. Extraia uma promessa sincera do indivíduo de que ele ou ela não vai cometer suicídio:


1. Sem que se comunique com a equipe de saúde ou a você;
2. Por um período específico (por exemplo: “Prometa-me que não tentará pelo prazo de uma semana, um mês, etc”. Negocie um prazo!!)

O objetivo é ganhar tempo até conseguir ajuda especializada ou até que as medidas tomadas comecem a dar resultado.


• Encaminhe a pessoa ao psiquiatra, ou agende uma consulta o mais breve possível, dentro do período em que foi feito o contrato com a pessoa.
• Entre em contato com a família, amigos e/ou colegas e reforce seu apoio. Antes de fazer esse contato, peça autorização da pessoa, para deixá-lo ciente sobre quais informações serão dadas, preservando o sigilo.
Algumas medidas de prevenção ao suicídio que poderão ser realizadas pelos familiares/amigos/colegas, como:
- impedir o acesso, aos meios para cometer suicídio. Exemplos: esconder armas, facas, cordas, deixar medicamentos em local que a pessoas não tenha acesso, de preferência trancados, e com alguém responsável em administrá-los.
Explique que estas medidas são temporárias, até que ele/ela melhore o suficiente para reassumir o controle.

NEGOCIE COM SINCERIDADE! PEÇA O AVAL DA PESSOA PARA TOMAR AS MEDIDAS NECESSÁRIAS PARA AJUDÁ-LO!
ALTO RISCO

A pessoa tem um plano definido, tem os meios para fazê-lo, e planeja fazê-lo prontamente. Muitas vezes já tomou algumas providências prévias e parece estar se despedindo. 


Ação Necessária:

• Estar junto da pessoa. Nunca deixá-la sozinha.

• Gentilmente falar com a pessoa e remover as pílulas, faca, arma, venenos, etc. (distânciá-lo dos meios de cometer suicídio). Explicar que você está ali para ajudá-lo, protegê-lo e que no momento ele/ela parece estar com muita dificuldade para comandar a própria vida; está confuso.
• Fazer um contrato, como descrito anteriormente, tente ganhar tempo. Faça prometê-lo que irá esperar um determinado tempo antes de tentar tirar a própria vida
• Informar outros membros próximos da família e/ou amigos e reafirmar seu apoio.
• Caso você não tenha acesso rápido a um psiquiatra, entre em contato com o serviço de emergência mais próximo. Providencie uma ambulância e encaminhe a pessoa ao Pronto Socorro (psiquiátrico de preferência). Explique ao profissional que presta o atendimento o que está ocorrendo, afinal, você já conseguiu obter informações importantes.

ENCAMINHANDO A PESSOA COM RISCO DE SUICÍDIO:


Como encaminhar:

• Você deve ter tempo para explicar à pessoa a razão do acompanhamento profissional;

• Marcar a consulta;
• Esclareça à pessoa que o encaminhamento não significa que você está lavando as mãos em relação ao problema, mas que acha que uma ajuda  especializada poderá ser de grande valia;
• Veja a pessoa depois da consulta;
• Tente obter informações sobre como foi o acompanhamento;
• Mantenha contato periódico.

RECURSOS DA COMUNIDADE:

 
As fontes de apoio usualmente disponíveis são:


• Família;
• Companheiros/namorados;
• Amigos;
• Colegas;
• Lideres religiosos;
• Profissionais de saúde;
• Grupos de apoio, ex. Centro de Valorização da Vida (CVV) www.cvv.com.br ou pelo fone 141. A lista completa de postos de atendimento do CVV encontram-se no endereço: http://www.cvv.org.br/postos_cvv.pdf


Como obter estes recursos?

 
• Tente conseguir permissão da pessoa para recrutar quem possa ajudá-lo, em geral alguém de sua confiança, e depois entre em contato com essas pessoas.
• Mesmo que a permissão não seja dada, em uma situação de risco importante, tente localizar que possa ajudá-lo (profissionais, familiares, amigos, etc)
• Caso haja resistência em receber apoio de um profissional, explique que algumas vezes é mais fácil falar com um estranho do que com uma pessoa amada, para que ele ou ela não se sinta negligenciado ou ferido.
• Fale com os demais familiares e amigos sem acusá-los ou fazê-los sentirem-se culpados (aumente sua rede de apoio).
• Fique atento, também, às necessidades dos que se propuseram a ajudar.




O QUE FAZER E O QUE NÃO FAZER:


O QUE FAZER:


• Ouvir, mostrar empatia, e ficar calmo;
• Ser afetuoso e dar apoio;
• Leve a situação a sério e verifique o grau de risco;
• Pergunte sobre tentativas anteriores;
• Explore as outras saídas, além do suicídio;
• Pergunte sobre o plano de suicídio;
• Ganhe tempo – faça um contrato;
• Identifique outras formas de dar apoio emocional;
• Remova os meios, pelos quais a pessoa possa se matar;
• Tome atitudes, consiga ajuda;
• Se o risco é grande, fique com a pessoa.


O QUE NÃO FAZER:

• Ignorar a situação;
• Ficar chocado ou envergonhado e em pânico;
• Tentar se livrar do problema acionando outro serviço e considerar-se livre de qualquer ação;
• Falar que tudo vai ficar bem, sem agir para que isso aconteça;
• Desafiar a pessoa a continuar em frente;
• Fazer o problema parecer trivial;
• Dar falsas garantias;
• Jurar segredo;
• Deixar a pessoa sozinha.


É importante levar a pessoa à reflexão: porque não por na balança o que a vida pode oferecer de bom, e o que ela nos oferece de ruim? Vale a pena parar de caminhar? Esta é uma reflexão que deve ser feita com muita calma e longe do calor do momento...
Por que não revogar a decisão de morrer, e tomar a decisão de viver?


ESTRATÉGIA NACIONAL DE PREVENÇÃO DE SUICÍDIO:


Com  objetivo de reduzir taxas de suicídios e tentativas e os danos associados com comportamentos suicidas, como o impacto traumático do suicídio na família, nas comunidades, nos locais de trabalho, nas escolas, outras instituições e na sociedade brasileira, a Coordenação de Saúde Mental do Ministério da Saúde apresenta a ESTRATÉGIA NACIONAL PARA PREVENÇÃO DO SUICÍDIOLink

     LEIA MAIS:

  • Publicações da Organização Mundial de Saúde para Prevenção do Suicídio: 

     - Profissionais da saúde - equipes de saúde mental (em português): Link

    - Agentes prisionais (em inglês): Link

    - Profissionais da Saúde Primária:  Link 

    - Profissionais da Mídia: Link 

    - Grupos de Sobreviventes (em inglês): Link 

    - Professores e Educadores: Link

    - Profissionais de Aconselhamento (em inglês): Link 

    - No ambiente de trabalho (em inglês): Link


(Adaptado do Manual dirigido à profissionais da saúde em Centros de Atenção Psicossocial do Projeto ComViver)


SUICÍDIO




"Estou deitada em minha cama. Ouço a chuva caindo lá fora...
Aqui dentro meu coração está em mil pedacinhos...
Começo a me lembrar de um passado que está me destruindo aos poucos...
Cada lembrança é como uma faca, que tem o poder de me cortar ao meio...
Sinto as lágrimas correndo sobre minha face; tento segurar mas não consigo.
Sinto como um nó sobre a minha garganta, e não consigo respirar direito...
Fecho meus olhos e começo a pensar: "O que fiz para merecer tudo isso?"
Queria tanto voltar no tempo e mudar tudo...
Já não me sinto, não sei mais quem eu sou. Abro meus olhos e vejo as paredes; a escuridão reina sobre meu quarto...
Preciso aliviar esta dor que não quer sair...Pego a lâmina e vou cortando ...
Sinto meu sangue escorrendo pelos pulso, mas onde está meu alivio ?
Vejo aquele sangue escorrendo, e é como se estivesse libertando minha alma da escuridão...
Sinto o frio chegando; as cores começam a desaparecer... Sinto a morte ao meu lado me segurando pelos braços e me levando... Então acordo em um hospital, e percebo que a dor ainda existe...
Quando vou conseguir me livrar desta dor? Não quero mais viver, não quero ser uma casca ambulante!
Vou subindo até chegar no mais alto do prédio e pulo para minha liberdade eterna !"



SUICÍDIO:

Edwin Schneidman definiu o suicídio como “ato consciente de aniquilação auto-induzida, melhor entendida como multidimensional em um individuo carente, que define uma questão para a qual o ato é percebido como melhor solução”.
Podemos concluir, mediante esta definição, que o suicídio ocorre quando o individuo vê-se em uma situação na qual ele não enxerga uma saída; onde não há solução ou apoio para seu estado atual, e que a própria morte seria a única solução para sua própria dor.
Não se trata de um ato aleatório ou sem finalidade, pelo contrário. Trata-se do escape do problema ou da crise pela qual a pessoa passa. Trata-se, invariavelmente, de um sofrimento intenso, estando associado a necessidades frustradas ou não totalmente satisfeitas, ao sentimento de desespero, desamparo, desesperança, conflitos internos, dor  e um estresse insuportável.
O suicida geralmente emite sinais de angustia.
Mais de um milhão de pessoas cometem suicídio a cada ano, tornando-se esta a décima causa de morte no mundo. Trata-se de uma das principais causas de morte entre adolescentes e adultos com menos de 35 anos de idade. Entretanto, há uma estimativa de 10 a 20 milhões de tentativas de suicídios não-fatais a cada ano em todo o mundo.
Em todo o mundo as taxas de suicídio aumentaram 60% nos últimos 50 anos, principalmente nos países em desenvolvimento.
Em 2004, a média nacional era de 4,5 mortes por 100 mil habitantes, de acordo com um estudo feito pelo Ministério da Saúde, em parceria com universidades públicas e privadas.
Embora esta taxa de mortalidade por suicídios seja considerada baixa, regionalmente alguns estados e municípios apresentam taxas duas vezes superiores à média nacional, como, por exemplo, o estado de Mato Grosso do Sul e Rio Grande do Sul. Nesse último, o índice de suicídios na população é de 9,8 suicídios / 100.000 habitantes, mas em determinadas faixas etárias, as taxas chegam a 30,2 / 100.000 !!!
Desde a década de 90 a Organização Mundial de Saúde (OMS) trata o suicídio como um problema de saúde pública. No Brasil, a questão foi assumida como tal em dezembro de 2005, quando o então ministro da Saúde, Saraiva Felipe, assinou uma portaria instituindo o grupo de trabalho responsável pela elaboração de políticas nacionais de prevenção ao suicídio.
Uma estratégia nacional de prevenção, como a que se organiza no Brasil, envolve uma série de atividades, em diferentes níveis. Uma vez que várias doenças mentais associam-se ao suicídio, a detecção precoce e o tratamento apropriado dessas condições são estratégias importantes na sua prevenção.
Contudo, como um sério problema de saúde pública, a prevenção do comportamento suicida, infelizmente, não é uma tarefa fácil.
O comportamento suicida vem ganhando impulso em termos numéricos e, principalmente, de impacto, como podemos ver pelos dados da Organização Mundial da Saúde (OMS):
• O número de mortes por suicídio, em termos globais, para o ano de 2.003, girou em torno de 900.000 pessoas.
• Na faixa etária entre 15 e 35 anos, o suicídio está entre as três maiores causas de morte.
• Nos últimos 45 anos, a mortalidade global por suicídio vem migrando em participação percentual do grupo dos mais idosos para o de indivíduos mais jovens (15 a 45 anos).
• Em indivíduos entre 15 e 44 anos, o suicídio é a sexta causa de incapacitação.
• Para cada suicídio há, em média, 5 ou 6 pessoas próximas ao falecido que sofrem conseqüências emocionais, sociais e econômicas.
• 1,4% do ônus global ocasionado por doenças no ano 2002 foi devido a tentativas de suicídio, e estima-se que chegará a 2,4% em 2020.

Alguns fatores estão associados à maior incidência de suicídios. Podemos citar:

SEXO: homens cometem mais suicídios (índice três vezes maior), contudo, as mulheres são mais propensas a tentarem suicídio que os homens. A taxa mais alta de suicídio entre os homens está relacionada aos métodos utilizados por eles (homens usam armas de fogo, enforcamento ou precipitação de locais altos, enquanto mulheres tendem a tomar dosagens excessivas de substâncias como drogas, medicamentos ou veneno, mas estão começando a usar armas de fogo mais frequentemente do que a anos atrás).

IDADE: as taxas de suicídio aumentam com a idade, demonstranto a importância da meia-idade. Entre homens, o suicídio atinge pico e continua a aumentar após os 45 anos; entre mulheres, o maior numero de suicídios completados ocorre após os 55 anos. Os idosos tentam suicídio menos vezes que as pessoas mais jovens.

RAÇA: a taxa de suicídio entre brancos é quase duas vezes maior do que entre não-brancos, mas estes números estão sendo questionados, já que o índice de suicídio entre negros tem aumentado.
 
ESTADO CIVIL: o casamento reforçado por filhos, parece diminuir significativamente os riscos de suicídios. Entre pessoas casadas, a taxa é de 11 por 100.000, já as pessoas solteira, jamais casadas, tem índice duas vezes maior.

OCUPAÇÃO: quanto mais alta a posição social do individuo, maior o risco de suicídio, mas uma queda na situação social aumenta o risco. O trabalho, em geral, protege contra o suicídio, já que a incidência de suicídio é maior entre desempregados.

SAÚDE FÍSICA: o relacionamento entre saúde e doença física com suicídio é significativo. O atendimento médico anterior parece ser um indicador de risco para o suicídio: 32% dos suicidas receberam atendimento médico nos seis meses que antecedem a morte. Por exemplo, 50% dos homens com câncer que cometem suicídio fazem-no dentro de um ano após o recebimento do diagnóstico. O câncer de mama ou genital é encontrado em 70% das mulheres com câncer que cometem suicídio.
 
SAÚDE MENTAL: O risco de suicídio entre pacientes psiquiátricos é de 3 a 12 vezes maior, se comparada àqueles que não possuem patologia mental. Os fatores psiquiátricos mais significativos no suicídio são: alcoolismo, abuso de outras substâncias, transtornos depressivos, esquizofrenia e outras doenças mentais. Os transtornos depressivos contribuem com 80% dos casos, enquanto a esquizofrenia, 10%. Entre as pessoas com patologias psiquiátricas que cometem suicídio, 25% são dependentes de álcool, e têm mais de uma patologia diagnosticada. O diagnóstico que traz, em si, maior risco para o suicídio em ambos os sexos, são os transtornos de humor.
Vinte e cinco por cento de todos os pacientes com histórico de comportamento violento ou impulsivo podem vir a cometer suicídio. Hospitalização psiquiátrica anterior também aumenta o risco.
Uma porcentagem pequena, mas significativa. Dos pacientes psiquiátricos que cometem o suicídio, fazem-no durante a internação psiquiátrica.
O risco também é maior durante os primeiros meses após a alta em uma instituição psiquiátrica.
Um estudo realizado em Iowa observou 5.000 mulheres após a alta em uma instituição psiquiátrica. Nos três primeiros meses após a alta, observou-se que o índice de suicídio era 275 vezes maior que a média da população feminina daquela cidade.

É importante estar atento a algumas patologias psiquiátricas em específico, em que o índice de suicídio é maior. São elas:


TRANSTORNOS DEPRESSIVOS: o transtorno de humor é o mais comumente associado ao suicídio, já que o risco no período no período de depressão é bem maior (o que não significa que uma tentativa possa ocorrer durante o episódio eufórico).
Entre os demais portadores de transtornos depressivos, o risco é maior no inicio ou no final do episódio depressivo. Estudos mostram que um terço ou mais dos pacientes com depressão, cometem suicídio dentro do período de seis meses após alta hospitalar, provavelmente devido a uma recaída.
Vale lembrar que a depressão não está associada somente ao suicídio concluído, mas também a tentativas sérias.


ESQUIZOFRENIA: entre eles, o risco é bem alto. Aproximadamente 10% dos esquizofrênicos morrem em virtude de suicídio, que ocorre na maioria das vezes, nos primeiros anos após o diagnóstico da doença. Como o diagnóstico ocorre muitas vezes ainda na juventude (sobretudo nos homens), é comum que a tentativa neste grupo ocorra em pessoas de pouca idade.
Cerca de 75% dos esquizofrênicos que cometem suicídio são homens não-casados. Aproximadamente 50% deles fazem uma tentativa anterior. Os sintomas depressivos comuns no transtorno estão intimamente associados ao episódio suicida, e ao contrário do que se possa imaginar, apenas uma pequena parcela cometeu suicídio por causa de instruções alucinatórias, ou para escapar de delírios persecutórios (idéia de que está sendo perseguido). Portanto, na esquizofrenia são fatores de risco para o suicídio: ser jovem, ser homem, solteiro, ter uma tentativa anterior, ser vulnerável aos sintomas da depressão e ter alta hospitalar recente.

DEPENDÊNCIA DE ÀLCOOL E OUTRAS SUBSTÂNCIAS: Até 15% dos alcoólicos cometem o suicídio. Cerca de 80% dos alcoólatras suicidas são homens. Tendem a ser brancos, de meia-idade, não casados, sem amigos, sociamente isolados e bebendo atualmente. Até 40% fizeram tentativa anterior. Até 50% deles passaram pela perda de um relacionamento afetivo intimo durante o ano anterior, e muitos são classificados como deprimidos durante o episódio suicida.
Quanto às substâncias químicas, estudos de diferentes paises mostram que existe risco aumentado para suicídio entre indivíduos que abusam de substâncias. Isso ocorre devido ao efeito intoxicante destas substâncias (overdose) e ao efeito desinibidor de muitas delas (isto é, a pessoa pode ter mais coragem em se matar após o uso de certas drogas).
O abuso de substâncias é a segunda causa mais comum de suicídio depois dos transtornos de humor. Até 25% dos toxicodependentes e alcoólicos cometem suicídio. Em adolescentes, o número é maior com álcool ou abuso de drogas, que desempenha um papel em até 70% dos suicídios. Foi recomendado que todos os toxicodependentes ou alcoólicos são investigadas por pensamentos suicidas, devido ao elevado risco de suicídio.
Contudo, vale lembrar que quando utilizo o termo "substâncias quimicas", não me refiro apenas às drogas ilicitas, mas também a medicamentos prescritos. O consumo exacerbado de medicamentos prescritos pode levar à morte. Casos mais recentes que vieram a público, foi a morte do ator Heath Ledger pelo consumo exacerbado acidental de calmantes e soniferos, e do cantor Michael Jackson, por fortes analgésicos.

(O ator Heath Ledger)

TRANSTORNOS DE PERSONALIDADE: este transtorno pode ser um determinante do comportamento suicida por vários fatores: por predispor a transtornos psiquiátricos maiores, como transtorno depressivo ou dependência de álcool, por levar a dificuldade em relacionamentos, ajustamento social e isolamento, por precipitar eventos de vida indesejáveis, por prejudicar a capacidade da pessoa em lidar com outro transtorno psiquiátrico ou físico, e por dificultar o relacionamento com pessoas à sua volta (como familiares, amigos, médicos, etc.).
Estima-se que 5% dos pacientes com transtorno de personalidade anti-social cometem suicídio.
  
É importante avaliar também comportamento suicida anterior, já que este é, talvez, o melhor indicativo de que a pessoa tem risco aumentado para cometer suicídio. Estudos mostram que 40% dos pacientes deprimidos que cometem suicídio, fazem-no após uma tentativa anterior, sendo que este risco é aumentado nos primeiros três meses após a tentativa anterior.
O grande problema “escondido” neste fato é a idéia de que uma tentativa de suicídio pode ser apenas uma forma de chamar a atenção. A população em geral tem a idéia distorcida de que a pessoa que deseja cometer suicídio, o faz sem deixar avisos, e, portanto, uma tentativa de suicídio frustrada ou na qual o individuo emite “avisos” sobre está intenção, não deve ser levada a sério.
Este ponto de vista pode ser perigoso. Uma tentativa de suicídio deve ser sempre levada a sério, ainda que aparentemente seja uma tentativa de apenas chamar a atenção. Ela pode ser muito mais que isso, pode ser um pedido de socorro! 
Atriz Leila Lopes, que suicidou-se
em 2009
Outro ponto importante de atenção, é que pessoas aparentemente sem problemas também podem cometer suicidio. Em certos momentos somos surpreendidos ao saber que individuos aparentemente saudáveis e felizes podem vir a dar fim à propria vida. O comportamento suicída não tem "cara". Para isso, é importante conhecer certos "sinais" de um possivel comportamento suicida. Isso será tratado no próximo post.




VIDEO: DEPRESSÃO E SUICÍDIO







FONTES:

Ferreira, E. Suicídio. Internet. In Diário Virtual. Disponivel em: http://elaiineh1990.blogspot.com/2011/02/suicidio.html. Acesso em abril de 2011.
 

Kaplan, HI. Sadock, BJ. Grebb, JA. Compêndio de Psiquiatria: Ciências do Comportamento e Psiquiatria Clínica. 7ª ed. Artmed. São Paulo, 2005.

Bertolote JM, Fleischmann A. "Suicide and psychiatric diagnosis: a worldwide perspective" (PDF). World Psychiatry 1 (3): 181–5. 2001.

Brasil vê suicídio como questão de saúde pública. Disponível em: http://www.ipcdigital.com/br/Noticias/Brasil/Brasil-ve-suicidio-como-questao-de-saude-publica 

acesso em 03/2011.

Botega, N.J.; Barros M.A.B.; Oliveira, H.B.; Dalgalarrondo, P.; Marin-León, L. (2005). Comportamento suicida na comunidade: Fatores associados à ideação suicida. Revista Brasileira de Psiquiatria. 27(1): 2-5.

Levin JD et cols. Introduction to chemical dependency counseling. 7ª ed. Rowman & Littlefield. NJ, 2001.